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A MOVIMENTAÇÃO, A APRESENTAÇÃO, AS FOTOGRAFIAS E O PASTOR ALEMÃO

Por Carlos Vianna Neto

 

Alguns aspectos relacionados ao cão Pastor Alemão, notadamente nos últimos cinquenta anos, promoveram interferências significativas na condução da raça, refletidas em sua forma de movimentação, no modo de ser apresentado nas exposições e nas publicações de fotografias.

A movimentação do cão Pastor Alemão, como indicado no standard da raça, deve ser solta, livre, ampla, fluente, rente ao solo e potente, sem demonstrar esforço para desempenhá-la. As corretas proporções, com boa distribuição do peso e consequente equilíbrio, permite, através de seus membros, corretamente angulados, sem exageros ou faltas e firmeza geral de ligamentos formar o conjunto necessário para o desenvolvimento de uma movimentação resistente e típica de um trotador como descrita no standard.

Os que acompanharam a evolução da raça no decorrer dos últimos cinquenta anos, percebem claramente que esta atingiu momentos de muita proximidade ao descrito no standard, notadamente nas décadas 80 e 90, quando uma grande quantidade de indivíduos de corretas anatomia e movimentação ocupavam as posições de destaque nas principais exposições e na reprodução. Foram anos em que invariavelmente eram encontrados cães que evidenciavam a preocupação por quem dirigia a criação, em não abrir mão de uma correta anatomia e movimentação, assim como o caráter. A ânsia, talvez, nas décadas seguintes, de uma evolução acelerada, em que se procurou tornar cada vez mais chamativos os aspectos que favoreciam a comercialização, tais como o aumento do tamanho das cabeças, tórax, angulações que muitas vezes ultrapassaram os limites da tolerância, trouxeram deslocamentos não condizentes com o típico movimento do cão Pastor Alemão, ligamentos frágeis e pouco resistentes das articulações, como também excessos de tamanho, passaram a oferecer uma falsa ideia de imponência e potência, que causam impacto à primeira vista, e que na realidade não deixam de ser bonitos e atraentes, mas que pecam na funcionalidade e não são como um verdadeiro Pastor Alemão.

É perfeitamente normal que se queira um cão bonito e vistoso, sem, contudo, perder de vista as condições estruturais que fazem o Pastor Alemão se distinguir das demais raças. Quais raças são capazes de trotar como um Pastor Alemão? Esse aspecto é um patrimônio do qual a raça não pode e não deve prescindir. A atenção aos aspectos estruturais como descrito no standard é de importância crucial para a preservação da raça como deve ser. Gostos pessoais devem ser permitidos na medida dos limites do standard, para isso há uma grande variedade de estilos e duas variedades de pelagem.

Tem-se cores e tonalidades em quantidade que permite as diversas escolhas, como também alguns aspectos estruturais. Uns preferem cães mais encorpados, outros menos. Tudo isso é permitido desde que não sejam ultrapassados os limites do bom senso e do standard da raça

O modo de apresentação nas exposições variou no decorrer dos anos, positivamente em relação às qualidades que fizeram do Pastor Alemão líder no universo canino, e muitas vezes negativamente, nas décadas seguintes. Antes, percebeu-se que uma tensão na guia favorecia a fluência do trote, a plasticidade, oferecia maior tonicidade muscular. Verificava-se na movimentação dos cães a correta amplitude de suas passadas, o posicionamento ideal da linha superior, projeção do pescoço, proporcionando um movimento equilibrado de correto posicionamento do centro de gravidade, permitindo assim, o máximo de aproveitamento.

Nas apresentações, era comum os “handlers” perceberem, pelo fluir da movimentação, se o cão desenvolvia uma boa elasticidade, sem demasiados esforços, ou se necessitava de uma tensão maior. Sua habilidade determinava, ao saber manejar a guia, deixandoa escorrer pela mão ou travando-a, a necessidade do momento. Haviam os chamadores, que costumavam não exagerar nos chamamentos para que não fizesse com que os cães puxassem demais. As velocidades dos trotes não eram excessivas. Isto permitia avaliar os cães em movimento por mais tempo, sem que apresentassem cansaço excessivo.

Nas décadas seguintes, possivelmente no afã de mostrar maior capacidade de desempenho dos cães, a forma de apresentação se modificou. As apresentações em parado (Stay) tornaram-se muitas vezes diferentes do desejável, proliferou um modo forçado de colocar os cães para avaliação, não importando se o cão possuía angulações escassas, corretas, pronunciadas ou exageradas do trem posterior, o modo de colocar na maioria das vezes passou a ser o mesmo, força-se para aparentar angulações que não são as do Pastor Alemão, e de nenhuma outra raça de cães. Posicionar os cães desta forma compromete outras partes, força negativamente a aparência da linha superior, mostra a região lombar carpeada , quando muitas vezes não é, a garupa mais inclinada do que é na realidade e sugere um comprimento excessivo da cauda, já que esta passa a repousar no solo, uma parte significativa de sua extensão.

Nas apresentações em movimento, sejam no caminhar ou ao trote, há, tanto um excessivo tensionamento da guia, como excessos por parte de chamadores que insistentemente querem que os cães não parem de olhá-los e segui-los. Este modo de apresentação realça um modo de caminhar e trotar que difere do movimento característico do Pastor Alemão, quase sempre o mostra tracionando de forma excessiva, dando a impressão de ser um cão de trenó, tracionador, o que definitivamente não é, e mostra problemas que muitas vezes não existem, como os passos curtos dos anteriores, o levantar desnecessário das mãos, e da cabeça, fazendo parecer um cavalo Mangalarga Marchador, desloca o centro de gravidade para trás, força o direcionamento do movimento mais para cima do que para a frente e nos casos de uma angulação pronunciada dos posteriores, força uma pisada com os jarretes, comprometendo a direção da força de propulsão, provoca carpeamento e outras compensações que distorcem os movimentos dos anteriores. 

Uma avaliação, sobretudo nas classes adultas, em trote,sem a guia, permite avaliar com mais precisão os movimentos e o comportamento geral da estrutura, assim como nos das classes jovens, com a guia frouxa, sem tensionamentos, como indicado no regulamento de exposições.

As fotografias publicadas, que com frequência, que durante muitos anos receberam retoques para leves correções de possíveis imperfeições. Com o advento das tecnologias avançadas, empregadas na manipulação de imagens, passaram a apresentar verdadeiras aberrações, desde manipulações nas cores a modificações na estrutura do animal fotografado. Constata-se modificações absurdas em formatos de cabeças, com stops excessivamente marcados, ombros excessivamente angulados, de posição quase horizontal dos úmeros, coxas alargadas de forma exagerada, tíbias paralelas ao solo, tórax aumentados, e distorção da aparência em prejuízo da imagem real.

Distorções, sejam da estrutura, de apresentações em exposições ou de manipulações em fotografias, induzem a interpretações equivocadas sobre a correção da estrutura, a forma correta de apresentação nas exposições ou a mentalização de modelos produzidos por fotografias nada condizentes com a realidade e o previsto no standard.

As consequências custam caro à raça, à imagem pública desta e a todos que atuam no ambiente da criação, com queda no n° de registros, de participantes nas exposições e demais atividades que envolvem a raça.

Não seria momento de reflexão sobre o tema, por parte de todos os envolvidos, criadores, juízes, expositores, treinadores, handlers e dirigentes? Admitir que há excessos? Que talvez se tenha ultrapassado os limites dos objetivos de criação? Que se deve buscar encontrar um modo de corrigir os rumos, sem vaidades ou interesses escusos, mas com comprometimento com a raça?