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As “Siegershows” como exposições-panorama de criação por excelência e

a importância e o valor da qualificação “VA” para criação na raça Pastor Alemão 

 

 

As exposições de criação especializadas na raça Pastor Alemão são eventos em que exemplares são avaliados quanto a sua aptidão para o trabalho, em conformidade com o standard (padrão) racial, servindo para orientar os criadores na incessante tarefa de desenvolvimento da raça, em suas características morfológicas, anatômicas e mentais.

 

Em artigo anterior, publicado já há alguns anos, esboçamos uma tentativa de expor o significado e a importância das exposições de criação especializadas de pastores alemães (disponível em: https://clubepastoralemao.com.br/artigos/detalhes/20), tendo o padrão, o standard da raça, como guia. Com este artigo, buscamos expor aos aficionados o importante significado “holístico” das exposições Siegerschau (Siegershow) denominadas, abreviadamente de “Sieger”, em cada país onde se faz presente a rede WUSV – Welt Union Schäferhunde Verein (a rede mundial especializada na raça Pastor Alemão).

 

Como é sabido, o berço do pastor alemão é a Alemanha; naquele país, desde o início do século passado, ocorre todos os anos, na primavera (normalmente no último final de semana de agosto ou no primeiro de setembro) uma grande exposição, o principal evento de seu calendário anual, a qual é denominada de “BundesSiegerZuchtSchau” (BSZS), abreviadamente “Siegerschau”. O evento é, etimologicamente, o “show dos vencedores”, ou “a exposição dos vencedores”. Trata-se da exposição que revela um grande panorama geral da criação alemã, em virtude da expressiva participação dos expositores, chegando, rotineiramente, a competirem mais de mil exemplares, a partir dos 12 meses de idade. Dada a importância da criação alemã, eixo central da raça, ano após ano este evento passou a atrair criadores de toda a Europa, e, em décadas mais recentes, criadores de todos os continentes.

 

Esta é uma característica fundamental das “BSZS”: a grande afluência dos criadores, com seus produtos, permite a apresentação de uma “massa crítica”, ou seja, uma amostra suficientemente grande da criação capaz de permitir a identificação de determinadas tendências, qualidades que se afirmam (ou que se esvaiam), e ainda defeitos e problemas que surgem ou se ampliam no conjunto da raça.

 

Outra característica fundamental das BundesSiegerZuchtSchau (abreviadamente “BSZS” ou “Siegerschau”), é a de que, em nosso entendimento, está relacionada com a primeira característica apontada – a grande afluência de exemplares competindo, algo que permite constituir uma amostra estatisticamente significativa da conjuntura da criação da raça Pastor Alemão.

 

Em tais eventos, na classe trabalho, composta por exclusivamente por cães adultos (com mais de 24 meses), selecionados para a reprodução e com título de trabalho, se confere a nomeclatura de Sieger para o macho vencedor e Siegerin para a fêmea vencedora.

Aos moldes de como ocorre na Alemanha, acontece uma vez ao ano em cada clube nacional filiado à rede WUSV, em países dos 4 continentes, as Siegershows nacionais, naturalmente em menor volume de exemplares, variando qualitativamente conforme o nível de criação, contando com o julgamento, via de regra, de juízes alemães.

 

Nestas exposições – e apenas nestas – há a possibilidade da concessão da qualificação “VA”. Tal sigla é a abreviatura de “Vouzürguche Auslese”, algo como “Excelente Selecionado”, ou “Excelente Escolha”, numa tradução “livre”, etimológica, ou, numa tradução de sentido, “Excelente Plus”, “Super Excelente” ou “Acima da Excelência”. Tal qualificação é concedida ao exemplares de maior destaque, tanto para reprodutores (machos) e quanto para matrizes (fêmeas), participantes da classe trabalho, que cumpram com uma série de pré requisitos impostos pelo sistema WUSV.

 

Esta qualificação é concedida exclusivamente para os cães considerados possuidores de qualidades consideradas superlativas. Cabe ressaltar que nas outras exposições de criação do restante do calendário anual, a qualificação máxima é “V” (Excelente). Assim sendo, a possibilidade de um cão de sua criação alcançar a qualificação VA se torna um atrativo para os criadores de cães de excelência.

 

 

 

Por que razão, então, foi criada esta qualificação “VA” e porque só podem alcançar o “Auslese” cães que competem nas Siegershows?

 

Justamente pelo caráter holístico de tais julgamentos, que levam em conta o panorama geral da raça, percepção permitida pela grande amostra constituída pelos exemplares na pista; assim, os juízes conseguem identificar as características que devem ser fixadas no momento, ou as tendências que devem interromper, e tais intentos não são obtidos se os criadores ficarem fascinados, atraídos, unicamente pelo “Sieger”, pelo macho vencedor da classe de trabalho.

 

Nos primórdios da raça, havia tal tendência, a de que os principais criadores utilizassem suas melhores fêmeas somente com o “campeão”, o grande sedutor dos criadores, que poderia, por evidente, transmitir suas qualidades (mas nem sempre isto ocorria), como também suas imperfeições e, além disto, apesar de ser o grande vencedor, poderia não ser o cão mais indicado para debelar alguns dos problemas conjunturais da criação ou para formar par com matrizes portadoras de determinadas características pontuais.

 

Percebendo isto, os mestres de criação resolveram criar a qualificação “VA”, de “Exclente Plus”, de forma a criar um conjunto (na Alemanha normalmente de 10 a 15 exemplares) considerados de qualidade superlativa, adequados para moldar a configuração da raça exigida pelo momento, evitando a utilização muito concentrada em um ou pouquíssimos reprodutores. Para que esta intenção fique muito clara, basta observar que em alguns anos sequer a classificação entre este seleto grupo de VAs é realizada, como ocorreu muito recentemente, há poucos anos, quando os exemplares deste grupo não tiveram fixado na qualificação a ordem de classificação (ordinariamente, os exemplares são classificados conforme sua colocação final, assim, o “Sieger” (vencedor) é o VA1, o vice-Sieger o VA2, e assim sucessivamente.

 

Em tal ponto é que realmente se destacam os famosos critérios “holísticos” na definição dos VAs (especialmente nos machos, lembrando que também as fêmeas são aquinhoadas com esta qualificação). Critérios que são sempre objeto de grandes especulações e discussões entre os aficionados, antes, durante e depois das Siegershows!

 

Nas exposições habituais, há um peso muito maior para o exemplar individualmente considerado na sua comparação abstrata com o standard da raça; já nas Siegershows, há, evidentemente, um grande número de exemplares de qualidades superlativas, diferenciando-se por pequenos detalhes. É evidente que entra o gosto, a subjetividade do julgador nesta avaliação, mas há um peso grande para as características do conjunto da raça. Assim, se num dado momento se considera que, por exemplo, há um excesso de cães com ligamentos do trem posterior frouxos, haverá a tendência de colocar entre os VAs cães que mostrem correção e firmeza no trem posterior; mais do que isto: haverá a tendência não apenas de qualificar e classificar bem cães que mostrem em si tais qualidades, mas especialmente aqueles que mostrem transmitir a seus descendentes tais qualidades!

 

Não nos confundamos: não estamos dizendo que a partir de uma consideração a respeito de um problema conjuntural da raça, os juízes colocarão na frente animais eventualmente medíocres, mas com potencial de corrigir o problema detectado; se fosse assim, o que se obteria seria talvez a diminuição do problema, com acréscimo de outros tantos.

 

O que verdadeiramente ocorre é que entre cães de qualidades gerais muito aproximadas, superlativas, as tendências gerais evidenciadas pelo recorte da criação propiciado por uma Siegershow determinarão as escolhas, especialmente dos VAs, e a classificação de cada exemplar no grupo.

 

Desta forma, o julgamento dos machos selecionados é precedido pelo julgamento dos grupos de progênie – ou seja, o julgamento do conjunto de filhos de um determinado reprodutor (que poderá ou não estar competindo entre os machos selecionados), onde serão avaliadas as qualidades e falhas que este transmite, cotejadas com o que se requer para a criação como um todo no momento.

 

E a “sutileza” cresce: sempre há competindo, na classe de trabalho, cães que ainda não tem tempo suficiente na criação para poder apresentar seu próprio grupo de progênie (na Alemanha, nas Siegerschaus, são julgados cães a partir de 12 meses); assim, também são avaliados a progênie de seus pais, e também a qualidade reprodutiva de suas mães, levando a decisões de manter-se, entre os “VAs” (ou entre os primeiros “Vs”, a “antessala” para um exemplar tornar-se “VA” na próxima edição – no ano seguinte. Exemplares que representem determinadas linhas de sangue que se quer manter, por sua qualidade geral e, muitas vezes, por sua aptidão para melhorar determinados atributos tidos por falhos no conjunto da criação (ou com tendência a tornar-se falho).

 

Estas considerações e critérios, numa Siegershow, se estendem do julgamento de cães adultos (classe trabalho, selecionados) para o julgamento de cães jovens, com menos vinculação, é verdade, às questões de conjunto, “holísticas”, mas não, de forma alguma, divorciadas destas.

 

Este conceito, claramente desenvolvido e vigente na Alemanha, leva inclusive, muitas vezes, a critérios pré-definidos, por vezes “informais”, mas outras tantas vezes veiculados em regulamentos, como por exemplo: necessidade de apresentação de grupo de progênie para o exemplar ser VA ou colocar-se entre os primeiros postos dos VAs. O que retira da competição por este galardão máximo os exemplares recém adultos, que disputarão arduamente uma colocação entre os primeiros “Vs”, torcendo para que sejam valorizados pelos criadores, para que possam apresentar grupo de progênie no ano seguinte, para que finalmente possam tentar atingir o ambicionado “VA”.

 

Estas características todas foram absorvidas por todos, ou pela imensa maioria dos países com criação organizada de cães pastores alemães dentro da rede WUSV: a realização de uma grande exposição anual, denominada ou apelidada “Sieger”.

 

Na Argentina, por exemplo, importante país na criação de cães pastores alemães, a “Sieger Argentina” tem nome oficial: “Exposição Principal da Criação Argentina. Com igual tendência de julgamento e critérios “holísticos”, muitas vezes com estabelecimentos de requisitos formais para a concessão da qualificação VA: apresentação de grupo de progênie, os pais devem ser selecionados, em alguns casos também os avós dos postulantes a VA devem também ser selecionados, titulação em provas de trabalho, certificação de descendência, etc. Ou seja, há a tendência nestas “siegers” dos demais países de julgamento igualmente levando em conta o conjunto da criação e suas necessidades conjunturais.

 

Há dois problemas neste cenário, pensamos, e que são constantemente objeto de debates: primeiro, para que um critério “holístico” tenha peso expressivo na determinação dos VAs, é fundamental que determinada Siegershow nacional tenha efetiva “massa crítica”, ou seja, que a apresente uma mostra significativa da criação local, representando o conjunto do esforço dos criadores. O principal requisito para tanto é a quantidade, mas também é importante que não haja facilidades regionais em virtude da localização do evento (é por esta razão que no Brasil se definiu, no âmbito do CBPA – Clube Brasileiro do Pastor Alemão – que as “Siegershows” serão sempre realizadas no centro do país); se não há “massa crítica”, mas concomitantemente são definidos critérios holísticos para julgamento, isto pode introduzir um viés grande nos resultados, que, ao invés de cumprirem com o objetivo de ajudar a criação, vão de fato atrapalhar.

 

Por exemplo: há definição formal que para ser VA1 e VA2 é preciso apresentar grupo de progênie; caso seja feito isto numa cenário em que há ainda pouca expressiva afluência de competidores, com relativamente poucos criadores, com pouquíssimos grupos de progênie apresentados, muitas vezes numericamente inexpressivos, haverá a possibilidade de se entronar VA1 e VA2 cães eventualmente medíocres, ou menos qualificados, e qualificar e classificar atrás cães exuberantes, com enorme potencial de desenvolver a criação. Enfim, esta é uma discussão antiga e difícil de ser conclusiva.

 

O outro problema identificado por muitos aficionados é que normalmente são convidados juízes alemães para julgar as Siegers fora daquele país, e esta participação episódica destes obviamente muito qualificados árbitros não é suficiente para que possam fazer uma análise do panorama da criação e assim conduzir o julgamento de forma a propiciar o desenvolvimento, especialmente se a Sieger não tenha a condição de fornecer amostra estatística significativa; porém, mesmo que sejam exposições com intensa participação, ainda assim é difícil para os julgadores estrangeiros encontrarem os critérios mais adequados (vale lembrar que na Alemanha, os exemplares, para atingirem determinado posto, devem obrigatoriamente apresentar-se algumas vezes nas “pré-siegers” - exposições regionais - para os juízes que julgarão a Siegerschau alemã. Tal obstáculo é contornado quando os clubes locais adotam o interessante critério de definir os mestres de criação alemães (ou renomados mestres de criação de outros países) que julgarão suas Siegers nacionais, por um período que varia de 3 a 5 anos, permitindo assim, que tais julgamentos constituam uma contribuição expressiva e realmente holística para o desenvolvimento e aprimoramento da criação.

 

De tudo, fica muito evidente as razões para que os criadores e aficionados tenham um grande fetiche, um desejo ardente de que seus exemplares obtenham a sonhada qualificação VA, que coloca tais exemplares entre o destaque máximo da raça, propiciando um grande estímulo para que os demais criadores utilizem tais exemplares em seus programas de criação (seja utilizando macho VA, seja adquirindo filhos e filhas de fêmeas VAs), e angariando grande prestígio para seus criadores e proprietários.

 

A qualificação VA é tão importante, significativa e ambicionada pelos aficionados do pastor alemão, que há atualmente um regulamento de harmonização WUSV, entre os clubes especializados integrantes da rede mundial para homogeneizar e padronizar os requisitos para outorga desta tão disputada qualificação.

 

Portanto, sonhemos todos com a obtenção da qualificação VA para nossos exemplares, e nos esforcemos muito para isto. No fundo, a beleza de chegar no destino é efetivamente aproveitar a beleza da estrada!

  

 

Saudações pastoreiras,

  

Humberto Gautério 

titular do afixo Matilha dos Bravos

Núcleo Pelotas do CBPA

 

 

Cláudio Burck

titular do afixo La Blanqueada

Núcleo Pelotas do CBPA

 

 

 

Núcleo Pelotas do CBPA